“Bem-aventurado é aquele que não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.” Salmo 1, 1
Há muitos versículos bíblicos que são mal interpretados e entendidos de forma que não faz justiça ao seu sentido original. Esse é, sem dúvida, um deles.
É comum entender esse versículo como uma orientação para evitar o convívio com quem é considerado pecador, ímpio ou zombeteiro. Não se deve ouvir seus conselhos, nem seguir seu exemplo e nem partilhar de sua companhia.
Entretanto, o problema é bem mais amplo do que isso. Se considerarmos que Paulo afirma que “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm.3,23), não poderíamos conviver com ninguém! E, como nós também somos pecadores, até sozinhos estaríamos mal acompanhados.
Uma evidência ainda maior de que não é a convivência com pecadores que se trata nesse texto, é que Jesus, o Filho de Deus, que não desobedeceu ao Pai em nenhum momento de sua vida, não apenas recebia os pecadores, mas comia com eles (Lc.15,2). E partilhar uma refeição com uma pessoa era celebrar a comunhão ela. Por isso os fariseus ficaram escandalizados com Jesus!
Quando questionado sobre porque ele convivia com pessoas tão desqualificadas, Jesus foi taxativo: “Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes; eu não vim chamar justos, e sim pecadores” (Mc.2,17). O problema, portanto, não é o convívio com pecadores.
Ora, se o problema não é esse, do que esse versículo trata? Observe os verbos: andar, se deter e se assentar. Quem anda pelos caminhos que os ímpios aconselham, entendendo os ímpios aqui como quem é hostil a Deus, acaba se afastando de Deus; e, quando se afasta de Deus, começa a achar que o caminho dos pecadores não é tão ruim assim. Começa a fazer concessões para pequenas coisas questionáveis, mas que não parecem tão problemáticas. O próximo passo é se assentar com quem zomba de Deus. Uma coisa puxa a outra e, quando se percebe, já há uma distância enorme entre quem somos e quem devíamos ser. Às vezes se faz esse tipo de coisa só para obter aceitação social.
A afirmação do salmista é que são felizes os que não entram nessa cilada; os que percebem como ela afasta de Deus. Não se trata de não conviver com pecadores. Não se trata de evitar a vida social. Trata-se de continuar seguindo o caminho proposto por Deus para nós, mesmo em meio aos inúmeros caminhos que não conduzem à vida abundante.
Jesus foi obediente a Deus em todo o tempo, mesmo convivendo com pecadores. Nós somos chamados a seguir o seu exemplo. E lembre-se: não é possível ser bem-aventurado se escolhermos outro caminho.
Para pensar: Você não pode evitar que um pássaro voe sobre sua cabeça, mas pode, sim, evitar que ele faça um ninho sobre seus cabelos (Ditado chinês).