“O povo pergunta a Deus: “Que adianta jejuar, se tu nem notas? Por que passar fome, se não te importas com isso?” O Senhor responde: “A verdade é que nos dias de jejum vocês cuidam dos seus negócios e exploram os seus empregados.” Isaías 58, 3
O capítulo 58 de Isaías tem como tema central o jejum. O povo de Israel estava acostumado a promover atividades religiosas como o jejum para alcançar as bênçãos de Deus. Era assim que eles entendiam a relação de povo escolhido com o Deus único: eles ofereciam alguma atividade celebrativa ou sacrificial e Deus tinha de responder favoravelmente ao esforço.
Essa forma de pensar ficou conhecida como teologia da retribuição. Nela, o povo oferecia algo para Deus como forma de pressioná-lo a responder aos pedidos e, por isso, Deus tinha de retribuir a essas iniciativas. Era uma forma de toma lá dá cá religiosa.
O profeta então, fazendo sua função de ser a boca de Deus, anuncia que essa troca de favores não agrada ao Todo-poderoso. Perceba que, no texto de hoje, o povo reclama que Deus não está atendendo ao seu esforço. Deus não está se importando com o seu jejum. Na verdade, não está nem notando isso!
E por que Deus não está se importando com o jejum de seu povo? O próprio texto responde: não é com Deus que eles estão preocupados, mas com eles mesmos! Estão focados em seus próprios interesses e negócios. Tanto é assim que não se incomodam em explorar seus empregados, mesmo sabendo que Deus julga a favor dos que são explorados e dá comida aos que tem fome (Sl.146,7). Para eles, Deus é só um meio de alcançar seus próprios objetivos. Por isso a crítica do profeta!
É preciso notar que na antiga aliança de Deus com Israel era comum entender a relação com Deus como uma troca de favores. Isso vai mudar radicalmente na vinda de Jesus, que passa a marcar a prevalência da graça de Deus sobre todo esforço humano. Ou seja, a partir de Jesus, não há nada que o ser humano possa fazer para que Deus o ame mais do que já ama; nem fazer algo que possa levar Deus a deixar de o amar.
O que é estranho nos dias atuais é que, mesmo Jesus tendo mudado a relação do ser humano com Deus, há muita gente que ainda pensa como o povo de Israel nos tempos de Isaías, e quer comprar Deus com seus esforços e sacrifícios. Que fique claro: isso é impossível!
Mas o que não mudou é o fato de que Deus não aceita o jejum ou culto associado a injustiça. Por isso o profeta afirma que o que Deus quer é que “soltem aqueles que foram presos injustamente, que tirem de cima deles o peso que os faz sofrer, que ponham em liberdade os que estão sendo oprimidos, que acabem com todo tipo de escravidão. O jejum que agrada a Deus é que repartam a sua comida com os famintos, que recebam em casa os pobres que estão desabrigados, que deem roupas aos que não têm e que nunca deixem de socorrer os seus parentes” (Is.58,6-7). Isso valia para o povo de Israel. Isso vale para os seguidores de Jesus Cristo.
Para pensar: Não posso suportar iniquidade associada à reunião solene. (Is.1,13)