“Duas coisas te peço, ó Deus; não recuse o meu pedido, antes que eu morra: afasta de mim a falsidade e a mentira; não me dês nem a pobreza nem a riqueza; dá-me o pão que me for necessário, para não acontecer que, estando eu farto, te negue e diga: “Quem é o Senhor?” Ou que, empobrecido, venha a furtar e profane o nome de Deus.” Provérbios 30, 7 – 9
A oração do escritor de Provérbios nesse texto vai na contramão de tudo o que se entende como sucesso em nossos dias. Veja que ele não pede bênçãos, não pede prosperidade ou riqueza, não declara o que Deus deve fazer por ele. Por outro lado, também não pede a pobreza, que é o oposto da confissão positiva e muito valorizada por quem vê nela uma virtude. Algo que aproximaria a pessoa de Deus. Só a título de explicação, confissão positiva é o ato da pessoa confessar que já tem aquilo que ainda quer ter, e assim será feito.
A oração aqui é bem diferente. Aliás, essa oração lembra uma outra, ainda mais conhecida, aquela ensinada por Jesus aos seus seguidores: “dá-nos o pão nosso de cada dia” (Mt.6,11).
Tanto na oração do Pai Nosso quanto nesta oração do escritor de Provérbios, só se pede aquilo de que se necessita. Nada mais; nada menos. Quem faz o pedido sabe do perigo dos extremos. Da riqueza que pode fazer com que ele pense que não precisa mais de Deus; mas também da pobreza, que pode levá-lo a roubar para sobreviver e assim, desonrar o nome de Deus.
Há alguns anos atrás, numa igreja da qual fui membro, havia um casal que frequentava os cultos todas as vezes em que o comércio que eles mantinham começava a ir mal. Iam a todas as reuniões, oravam, cantavam e cultuavam. Quando as vendas começavam a crescer, e o comércio a melhorar, desapareciam da igreja. E isso se repetia nas crises econômicas que ocorriam de tempos em tempos.
O interesse em Deus era condicionado ao sucesso do comércio que mantinham, nesse caso, na falta desse sucesso. Quando tudo ia bem, a exemplo do que alerta a oração do escritor de Provérbios, achavam que não precisavam mais de Deus.
Esse tipo de fidelidade condicional é algo que se deve evitar. E, se você ouvir alguém fazendo a conexão da vida cristã com o sucesso econômico e a prosperidade, lembre-se desses dois textos: “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”, disse Jesus para os que achavam que riqueza era sinal de bênção divina (Lc.18,24); e “a minha graça te basta” (2Co.12,9), que foi a resposta de Deus para Paulo, mantendo sua limitação com o “espinho na carne”.
Pedir a Deus aquilo que é necessário para cada dia é sinal de confiança nele, de maturidade e de consciência da sua graça que, como afirma Paulo, é superabundante (Rm.5,20).
Para pensar: “Tudo é caro demais quando não é necessário” James Joyce.